revista ensaia/ edição zero/ laboratório/ notas do subterrâneo/ nota 24
Nota 24
Sobre o training físico do Teatro Laboratório (notas a partir do texto de minha dissertação de mestrado):
Grotowski destaca a confrontação como elemento fundamental da encenação e de seu trabalho com os atores no Teatro Laboratório no sentido de criar condições de desbloqueios do psiquismo de cada um deles. Grotowski buscou procedimentos que concretizassem sempre um âmbito de tensão a partir da contradição.
Grotowski e Cieslak elaboraram um training físico composto por estruturas corporais fixas, mas que também contém espaços para a improvisação. A ideia é que o ator possa construir um training conforme a relação entre a técnica criativa, sua imaginação e associações pessoais, resultante das tensões entre o que é individual do ator e a materialidade de seu contexto sócio histórico. Deste modo, é fundamental o trabalho sobre as conexões com o outro, os objetos, as superfícies, o espaço e a temporalidade. Nesta experimentação de Grotowski, o propósito é a diminuição do lapso existente entre o que o ator pensa e o que pode realizar, possibilitando que o corpo seja, o mais próximo possível, uma matéria psíquica.
Dois princípios fundamentam esta prática: a precisão e a espontaneidade. Trata-se de improvisação física, pois os materiais que organizam a sua criação são originários dos planos – corpo, espaço, objeto, tempo, fluxo performático e fluxo das expressões – que devem ser operados ao mesmo tempo em que é construída uma cartografia. A precisão está materializada em uma estrutura fixa de training que opera como suporte para os exercícios realizados. Estes exercícios comportam uma esfera que permite maior improvisação. Gostaria de esclarecer que minha primeira divisão do TF entre uma parte estrutural e outra parte menos fixa não procura marcar uma dualidade, mas se constitui em uma aproximação de uma tensão originária do TF que é a contradição dos elementos. Considero esta tensão como uma fratura primeira que permite um estado de análise que desenvolvo nesta dissertação e que suscita, portanto, a criação de um pensamento teórico a partir da materialidade desta prática.
A estrutura do TF deve ser realizada em um tempo que varia entre 25 a 30 minutos. Esta formalização temporal é entendida como elemento de precisão e balizamento para os processos de improvisação. Um dos participantes atua como líder e este é quem fornece o tempo entre os exercícios, o tempo das transições, a velocidade e a finalização.
Durante as experimentações, a figura desse guia pode se dividir entre os participantes e até desaparecer. A noção de conjunto, sempre problematizada pelos elementos de contradição e de tempo, passa por reformulações no sentido de se transformarem de um ponto fora (aquele guia que determina as passagens pelas etapas e o tempo do TF) para a introspecção dessas noções pelos participantes.