Poema para mulheres químicas
Agrippina Manhattan
O trabalho consiste em um poema criado por meio de anagramas (mistura das letras de uma palavra) feitos com o nome de duas substâncias usadas para realizar a transição hormonal MTF (male to female): o acetato de ciproterona, usado para interromper a produção de testosterona, e o valerato de estradiol, usado como repositor de progesterona. A obra vem do medo de começar a tomar esses medicamentos que oferecem riscos significativos à saúde, mas que simultaneamente suprem uma emergência de adequação do meu corpo à minha identidade. Criar um poema com eles torna-os mais próximos de mim e da minha sensibilidade, ao contrário dos nomes científicos aos quais não consigo me identificar.
Encontro nesse poema conforto
Encontro nele forças.
Eu faço a minha luta sozinha, compro mensalmente esse remédio em segredo.
O que os olhos não vêem é bombeado no meu coração
pelas minhas veias e artérias.
Mulheres cis tomam mensalmente anticoncepcional
Travestis tomam mensalmente anticoncepcional
Sou privilegiada
Me enveneno, me transformo
INCORPÓREA
DIALETOS IDOLATRE
ORA DILATÁVEL
ORA DESERTO
DOCE ATAQUE
ATACADA
ADAPTAR
O poema é uma parte de um processo de trabalho que acarretará e uma instalação a ser feita em exposição com curadoria do artista visual Yago Toscano.
Processo e obra, respiro e desabafo.
Por mim, pelo que corre em minhas veias e por todas.

Agrippina Manhattan é artista, pesquisadora e travesti. Nascida em São Gonçalo-RJ, seus trabalhos dialogam com questões de gênero, instituições e identidades. Aluna da Escola de Belas Artes da UFRJ, já integrou exposições coletivas como BA Photo/Tijuana em Buenos Aires (2017), Esquenta para Jack Smith (Capacete, curadoria de Andreas Valentim e Marcos Bonisson 2017), Carpintaria para Todos (Fortes D`Aloia e Gabriel, 2017), PEGA – Encontro de Alunos de Artes do Rio de Janeiro (Centro Municipal de Arte Helio Oiticica, 2017). Como pesquisadora, já participou Do Seminário Contingências promovido pelo PPGARTES-UERJ (2017) e do XII Congresso de História da Arte da Unicamp (2017).